A Igreja Frente aos Maçons

Desde o Papa Clemente XII, com a Constituição Apostólica “In eminenti”, de 28 de abril de 1738, até nossos dias, a Igreja tem proibido aos fiéis a adesão à maçonaria ou a associações maçônicas. Após o Concilio Vaticano II, houve quem levantasse a possibilidade de o católico, conservando a sua identidade, ingressar na maçonaria. Igualmente, se questionou a qual entidade se aplicava o interdito, pois há várias correntes: se à anglo-saxõnica ou à franco-maçonaria, a atéia e a deista, anticlerical ou de tendência católica.

Para superar essa interrogação, o Documento da Congregação para a Doutrina da Fé, com data de 26 de novembro de 1983, e que trata da atitude oficial da Igreja frente à maçonaria, utiliza a expressão “associações maçônicas”, sem distinguir umas das outras. É vedado a todos nós, eclesiásticos ou leigos, ingressar nessa organização, e quem o fizer está “em estado de pecado grave e não pode aproximar-se da sagrada comunhão”.

Entretanto, quem a elas se associar de boa-fé e ignorando penalidades não pecou gravemente.

Permanecer após tomar conhecimento da posição da Igreja seria formalizar o ato de desobediência em matéria grave.

A Congregação, no mesmo documento de 26 de novembro de 1983, declara que “não compete às autoridades eclesiásticas locais (Conferência Episcopal, bispos, párocos, sacerdotes, religiosos) pronunciarern-se sobre a natu reza das associações maçõnicas, comum juízo que implique derrogação do quanto acima estabelecido”. O texto faz referência à Declaração de 17 de fevereiro de 1981, que reservava à Sé Apostólica qualquer pronunciamento que implicasse derrogação da lei canônica em vigor. Tratava-se do cânon 2.335 do Código de Direito Canõnico de 1917, que previa excomunhão ipso facto a quem ingressasse na maçonaria.

Reconhecer uma incompatibilidade doutrinária não implica fomentar um clima de hostilidade. Preservar a própria identidade e defendê-la não significa incentivar atritos. Aliás, somente o respeito à verdade facilita a paz e a busca da concórdia entre os indivíduos.

O novo Código de Direito Canõnico assim se expressa: “Quem se inscreve em alguma associação que conspira contra a Igreja, seja punido com justa pena; e quem promove ou dirige uma dessas associações, seja punido com interdito” (cânon 1.374). No dia seguinte à entrada em vigor do novo código, isto é, 26 de novembro, é publicada a citada declaração com a aprovação do Santo Padre.

Diz o documento que a maçonaria não vem expressamente citada por um critério redacional e acrescenta: “Permanece, portanto, inalterado o parecer negativo da Igreja a respeito das associações maçõnicas, pois os seus princípios foram sempre considerados inconciliáveis com a doutrina da Igreja e, por isso, permanece proibida a inscrição nelas.”

Em 1997, a Livraria do Vaticano editou uma obra intitulada “A maçonaria nas disposições do Código de Direito Canônico de 1917 e de 1983”, de autoria de Zbigniew Suchecki. O sucesso levou à tradução para o italiano de outro livro do mesmo autor.

Eu fazia parte da comissão do novo código, na parte final da elaboração. Recordo-me bem. Houve uma emenda para fazer permanecer, de modo explícito, a condenação à maçonaria, como foi obtido para o aborto, com excornunhão latae sententiae. A votação, no caso do abortamento, alcançou os dois terços requeridos e foi incluído o termo. No que se refere à maçonaria, houve maioria a favor da explicitação da mesma associação, mas não com o índice requerido. Nos debates prévios foi alegado não ser necessário, pois o texto já continha uma proibição implícita.

Dom Boaventura Kloppenburg, em sua obra “Igreja e maçonaria: conciliação possível?” recentemente reeditada em quarta edição pela Vozes, trata profusamente deste assunto, no capítulo “Dos princípios do liberalismo religioso à maçonaria brasileira”. E no capitulo XI, “O maçom perante a Igreja Católica – As razões da condenação da maçonaria – Frontal oposição de doutrinas”. Outra obra recém-publicada pela Editora Santuário é “Maçonaria e Igreja Católica”, de dom João Evangelista Martins Terra.

Permanecendo a proibição no ensinamento da Igreja, houve nesse período pós-conciliar uma profunda modificação no relacionamento entre pessoas, entre católicos e maçons. Embora permanecendo separadas, existe um clima de respeito mútuo que permite um diálogo. O exemplo foi o aparecimento de reuniões entre católicos e maçons para estudo como a de uma Comissão das Grandes Lojas Reunidas da Alemanha e a Conferência Episcopal Alemã, de 1974 a 1980. A declaração final do episcopado alemão evidencia a incompatibilidade, pois a maçonaria não mudou em sua essência. A pesquisa acurada sobre rituais e fundamentos dessa instituição demonstra a existência de doutrinas que se excluem.

Entre as causas dessa separação, enumera: a ideologia dos maçons, o conceito de verdade, de religião, de Deus, a revelação, sobre a tolerância, os ritos, a perfeição do homem e a espiritualidade. De outro Iado, a realidade alemã vê a possibilidade de colaboração pastoral na área da justiça social e dos direitos humanos.

O fato de existirem eclesiásticos na maçonaria prova que há falhas na disciplina. São dadas explicações, não justificativas, baseadas em situações históricas, corno no caso da Independência do Brasil. Dom Boaventura Kloppenburg, em sua obra, examina o assunto e o reduz a dimensões reais.

O respeito mútuo e a fidelidade aos ensinamentos da Igreja nos possibilitam uma convivência pacífica com os irmãos maçons.

D. EUGENIO DE ARAUJO SALES – Cardeal-Arcebispo do Rio de Janeiro
Publicado no Jornal O Globo de 28/01/2001.

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