As bases filosóficas da Maçonaria –  Parte I

Introdução

A definição filosófica da Maçonaria transcende a sua definição jurídica, ou sociológica, como um sinceríssimo de filosofias espiritualista, um sinceríssimo cultural, o mais universal que podemos identificar, porque se trata de um complexo de aculturação dos mais ricos que se conhece, revelando conteúdos mágicos, formas ritualísticas e também racionalizações de uma instituição complexa embora de objectivos bem definidos. Eis ai uma nossa caracterização bem pessoal através da qual procuramos situar as bases filosóficas de um estilo de pensar e um estilo de agir.

São tantas as versões sobre as origens da Maçonaria que isto justifica uma grande dificuldade para situá-la numa posição. Em primeiro lugar, parece-nos que aqueles que a situam na Inglaterra, ou na França fazem uma pesquisa menos profunda e não se adentram na Maçonaria Real, esotérica e só apanham poucos aspectos históricos da instituição, numa visão superficial. Deslumbram-se com a Maçonaria esotérica, exterior, e sem intuição filosófica, anatomizam a instituição nos seus objectivos visíveis e mais superficiais.

Só pode entender o que é Maçonaria quem entende a sua filosofia, ou a rigor quem é conhecedor das filosofias orientais, todo teístas, quem a procura nos contextos culturais variados onde ela assume uma fisionomia particular embora mantendo sempre uma perspectiva do universal.

Maçonaria é universalismo no melhor sentido do termo, que reúne diferenças étnicas, religiosas, sócio-culturais, idiossincrasias raciais e de ordem psicológica numa convivência criadora da tolerância, a sua grande virtude. Daí que aceita grupos religiosos diferentes no seu seio, livros sagrados diversos conquanto que se mantenham um único postulado filosófico e também tornando dogma da instituição: a crença em Deus, seja ele a sua forma cristã ou outra forma monoteística. Mantém um idiossincrasia contra o politeísmo e sustenta, por coerência, uma antítese, p. ex., com Marxismo histórico e dialéctico.

Ao pesquisarmos sobre origens da Maçonaria, a seguir, constatamos na diversidade dos pontos de vista a dificuldade de situar uma filosofia maçónica única.

É ela uma convergência de filosofias espiritualistas orientais, que admite a tolerância e que cultiva um humanismo universalista de objectivos não só transcendentais mas também imanentes no processo histórico traduzidos na solidariedade.

A Maçonaria é uma sociedade secreta, de origem antiga possuindo diferentes graus iniciáticos e rituais.

Exemplo deste tipo de sociedade, formando um hipersistema, é o Grande Oriente do Brasil, cuja constituição de 1977 tem por pressuposto a Constituição de Anderson, de 1723, da Inglaterra, sendo uma instituição de objectivo universalista.

Define-se então como “uma instituição maçónico federativa, simbólica, regular e legítima que preside os grandes Orientes estaduais e as Lojas Simbólicas” (cap. II-1). No seu artigo primeiro, define-se como “uma pessoa de direito privado, fundado em 17 de Junho de 1822”.

A definição filosófica da Maçonaria encontra-se no item I, Titulo I, cap. 1: “A Maçonaria é uma instituição essencialmente filosófica, educativa, filantrópica e progressista”, que proclama a prevalência do espírito sobre a matéria, pugna pelo aperfeiçoamento moral, intelectual e social da humanidade, por meio do cumprimento inflexível do dever, da prática desinteressada da beneficência e da investigação constante da verdade”, sendo “os seus fins supremos a liberdade, a igualdade e a fraternidade”.

Numa determinada fase histórica da maçonaria, ela respira a chamada atmosférica da época”- a do Iluminismo, ou racionalismo dos “Enciclopedistas”, agindo como instituição social e política, comprometendo-se com as lutas sociais, como a independência dos povos, a luta contra a escravidão e o despotismo, e, aqui, assume uma forma de filosofia política que marcou a história dos povos. Define-se mais como Lojas básicas, mas não descubra, nos graus filosóficos, do cultivo das suas funções profundas secretas e religiosas enigmáticas.

As origens da Maçonaria Charles Bernardim (notas para servir à história da Maçonaria em Nancy, 1909) encontrou na sua pesquisa 39 opiniões diferentes sobre as origens da Maçonaria, as quais pode ser assim discriminadas (em número de vinte e duas, dentre as principais):

  1. origem ao período gótico
  2. origem na Inglaterra
  3. origem nos partidários dos Stuart
  4. origem da França
  5. origem na Suécia
  6. origem na China
  7. origem no Japão
  8. origem em Viena
  9. origem em Veneza
  10. origem nos jesuítas
  11. origem nos antigos Rosa-Cruzes
  12. origem nos templários
  13. origem nos Druidas
  14. origem no Egipto
  15. origem na Pérsia
  16. origem em Zoroastro
  17. origem nos magos
  18. origem na Ordem dos Assassinos
  19. origem nos maniqueus
  20. origem nos pedreiros que construíram o Templo de Salomão
  21. origem nos que construíram a Torre de Babel
  22. origem nos sobreviventes do Dilúvio

A este número pode-se acrescentar mais o seguinte:

  1. origem em Jesus Cristo
  2. origem na Índia antiga, etc.

O “Iluminismo” é um sistema de ideias cuja ideia nuclear é o primeiro da razão na interpretação dos factos humanos.

Para nós, não se trata apenas de um movimento característico do século XVIII, podendo as suas origens ser pesquisadas em Platão e na Bíblia.

O Primeiro, em TIMEU (69) fala do “O FOGO” do olho… fogo interior que brilha fora como se fosse um relâmpago”, e, na REPÚBLICA (508) escreve que “A luz e a visão parecem-se com o sol , a ciência da alma é como a luz para os olhos cegos”. Também in “Carta 7ª” (341).

Na Bíblia (salmos, XXXVI, 9), está expresso: “Porque em ti está o manancial da vida: na tua luz veremos a luz”.

Matheus (6,22) : “São os olhos a lâmpada do corpo”.

Paulo (Ep. Ef., 6,9): “Porque o fruto da luz consiste em toda bondade e justiça e verdade”.

Depois, em Santo Agostinho, aparece uma teoria da Iluminação. Nos “solilóquios” (P. L. XXXII, col, 877), compara Deus ao sol dos espíritos. A sabedoria seria um processo de iluminação ao Divino.

No “De Civitate dei” (415) surge o “verbo como a luz da alma”.

Depare-se, portanto, uma “Ilustração” antiga e outra moderna. R. Jolivet (Deiu, Soleil des esprits) reúne os textos agostinianos sobre o problema, e F. Cayre ( Les sources de l’amour divin) caracteriza a iluminação como “L’íntuition des primiéres idéias, en tant quélle est une participation à la lumiére de Dieu”.

As idéias iluministas modernas apareceram na Alemanha através da “corrente” Sturm und Drang” (tempestade e assalto) com Goethe, Schiller, Lessing. E o Iluminismo moderno tenta “espancar as trevas medievais”. Eis a chamada secularização, o laicismo moderno contra a sacralização da atitude anterior, manifesta com os Enciclopedistas, fonte da Declaração Universal dos Direitos do Homem, justificativa do individualismo. A teoria de Rousseau é uma explicação iluminista da realidade social.

O jus naturalismo grociano opõe-se ao jus naturalismo antigo porque é racionalista . E racionalista é a posição de Locke na Inglaterra, a de Locke e todos os “iluministas” ingleses e franceses.

O filósofo Inglês Locke é um dos grandes teóricos da LIBERDADE – adoptado pela MAÇONARIA na sua filosofia política.

Baseando-se na chamada “Lei da Natureza” , diz que a liberdade está contida entre “os poderes humanos”, ao lado do próprio corpo, a inquietude, o entendimento, a lei positiva, a sociabilidade.

E, nessa circunstância, a liberdade é não só meio mas condição da existência humana: condição e fundamento da verdadeira felicidade. Essa conclusão da ordem da filosofia política lockiana, adoptada pelos filósofos enciclopedistas franceses, e, posteriormente, pelos positivistas é princípio político da Maçonaria, portanto princípio filosófico da Maçonaria universal.

Define o filósofo a liberdade do seguinte modo, numa DEFINIÇÃO que é psicológica e também política: “A liberdade é … o poder do homem de realizar a sua acção particular segundo a sua própria vontade” ( Essay, cap. 21, arts, 14/27). É coerente a sua teoria político-moral com a sua teoria do conhecimento.

Conceitua, ademais, a liberdade como o facto moral, de modo idêntico a Kant, filósofo alemão.

Outra definição importante do autor é a lei, como meio para se atingir a felicidade. Daí que a liberdade pode coexistir com a lei – como exigências da natureza humana.

O homem realiza-se uma ordem ditada pela razão.

Se a liberdade é algo inerente à natureza humana que como tal deve ser respeitada, no entanto o filósofo fala também da imperfeição humana: “essas pobres criaturas finitas”, pois o homem pela liberdade está sujeito ao bem e ao mal.

O conceito de felicidade em Locke tem algo de estorrico. O homem terá sempre de construir ou reconstruir, para vender a sua fragilidade.

Finalmente, o pensamento lockiano político social é racionalista cristão constitucionalista, a viga mestra dos sistemas jurídicos modernos, que se expressa em parte no Liberalismo, mas cuja consequência a nosso ver atingem a teoria social e actual superadora do próprio liberalismo económico e político.

EM CONCLUSÃO: A Maçonaria esotérica (exterior), social, define, em termos de filosofia social e política como o Liberalismo e do ponto de vista esotérico (interior, profundo, secreto) como um Sincretismo religioso de religiões orientais mais antigas, todas deístas do tipo monoteísta, o que justifica um Sincretismo filosófico Universalista, verdadeiramente ecuménico, cujo único Dogma religioso e, também dogma jurídica, é a crença num Deus único.

A Maçonaria tem uma filosofia que se baseia em postulados morais e postulados religiosos.

  • No primeiro caso, ela defende a solidariedade, a lealdade e a fraternidade.
  • No segundo caso, ela propugna, a começar com o juramento da crença em Deus e no acto iniciatório, pelos actos esotéricos e litúrgicos das suas reuniões.

De forma que o sincretismo filosófico de diversas doutrinas Orientais, de fundo filosófico – religioso – característica de todas as religiões antigas – tende a conjurar-se na evolução em primeiro lugar das sociedades secretas em geral, e, particularmente, a marca definitivamente a Maçonaria – tornada instituições jurídica.

Definimos a Maçonaria como o principal modelo de Ecumenismo, muito antes que religiões o tenham pensado.

Em verdade, não encontramos outro facto histórico de verdadeiro Ecumenismo: indivíduos de diferentes religiões ingressam ou são iniciados. Na Maçonaria pronunciando o Juramento em Deus e conseguem viver em família – a família maçónica.

Poder-se-ia dizer talvez que a Maçonaria teria ocorrido, ao longo da sua história, principalmente neste século, algumas dissensões, sempre de carácter político ou administrativo, mas nunca de natureza doutrinária, a ponto de ferir os seus postulados morais, religiosos e finalmente filosóficos. Dai dizermos com justa razão que a Maçonaria constitui em perfeito sistema ecuménico, onde não há diferenças doutrinarias, ou mesmo liturgias de importância.

João Alves da Silva – Academia Maçónica de Letras de Alagoas – membro Honorário da Academia Maçónica de Letras, Ciências e Artes no Nordeste do Brasil.


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Um comentário

  1. […] No século XIX, os maçons eram conhecidos por sua profunda erudição, especialmente em filosofia12. Eles eram frequentemente vistos como opositores à Igreja Católica, não por hostilidade religiosa, mas por uma diferença fundamental de pensamento. A Maçonaria, com suas raízes na filosofia espiritualista e oriental, defendia a liberdade de pensamento e a busca pelo conhecimento1. Isso contrastava fortemente com a doutrina da Igreja Católica na época, que era vista como mais dogmática e menos aberta ao questionamento e à investigação intelectual. […]

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